Dificuldades financeiras revelam a fragilidade de jovens e idosos no cenário brasileiro

Por jair Henderson

O acesso ao crédito, quando utilizado de forma inteligente, pode ser um facilitador para o consumo consciente, a concretização de objetivos, o investimento em estudo, bem-estar, locomoção e até mesmo em novos negócios. Contudo, essa mesma ferramenta, se não for bem compreendida ou utilizada sem o devido cuidado, transforma-se em uma cilada traiçoeira, capaz de prender as pessoas em um ciclo vicioso de dívidas, ansiedade e decepção. No Brasil, essa situação tem afetado principalmente dois grupos que vivem fases bem diferentes da vida, mas que compartilham uma vulnerabilidade em comum: os jovens e os idosos.

Entre os mais jovens, especialmente aqueles pertencentes à chamada Geração Z, que cresceram em meio à tecnologia e se acostumaram a resolver tudo pelo celular, o problema não é a falta de informação, mas a maneira como essa informação é absorvida e colocada em prática. Segundo dados da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL), quase metade dos jovens dessa geração não tem o costume de controlar o próprio dinheiro. Muitos confessam que não anotam os gastos, não estabelecem metas de economia e nem sequer sabem quanto gastam por mês. As razões? Vão desde a ausência de incentivo à educação financeira nas escolas até a simples “preguiça”, como alguns entrevistados mencionaram em pesquisas recentes. Há também aqueles que ainda guardam dinheiro em casa ou na poupança, sem considerar outras opções de investimento que poderiam gerar melhores resultados. As consequências dessa falta de cuidado aparecem com força quando o assunto é o futuro: aproximadamente 75% dos jovens não pensam na aposentadoria, como se o tempo estivesse sempre ao seu lado e a velhice fosse algo distante demais para se preocupar.

Na outra extremidade da vida, os idosos enfrentam desafios distintos, mas com algumas semelhanças. A população brasileira com mais de 60 anos atingiu a marca de 32 milhões em 2023, e muitos desses indivíduos têm acesso facilitado ao crédito consignado, aquele que é descontado diretamente do benefício da aposentadoria ou pensão. Para muitos, essa é uma solução rápida para lidar com uma emergência ou até mesmo para complementar a renda familiar. No entanto, a falta de conhecimento sobre taxas de juros, prazos e condições contratuais transforma essa aparente facilidade em um perigo real. Entre 2018 e 2019, o índice de endividamento entre os idosos aumentou 45%. São pessoas que, em teoria, deveriam estar vivendo uma fase de tranquilidade, mas que acabam comprometendo grande parte de seus rendimentos com dívidas que, muitas vezes, não conseguem explicar de onde vieram.

As ramificações vão muito além das finanças. O acúmulo de dívidas tem pesado diretamente no bem-estar psicológico de inúmeros brasileiros, fomentando sentimentos como culpa, impotência, desvalorização pessoal e, em situações extremas, depressão. Para os mais velhos, essa conjuntura se torna ainda mais difícil devido à solidão e ao sentimento de que perderam o controle sobre suas vidas. Já entre os mais jovens, a dificuldade em concretizar sonhos e o receio de falhar em um cenário cada vez mais competitivo provocam angústia e incerteza.

A carência de instrução sobre finanças ao longo da vida, somada à disparidade social e à escassez de ações governamentais eficazes, alimenta um ciclo prejudicial que afeta não somente as pessoas individualmente, mas núcleos familiares inteiros. Em diversos lares, os pais contam com a aposentadoria dos avós, enquanto os filhos se afogam em dívidas no cartão de crédito ou no “pix parcelado”, numa tentativa arriscada de sustentar um padrão de vida impraticável. Isso causa atritos entre as gerações, desentendimentos velados e, com frequência, um desgaste emocional significativo.

O crédito em si não é o grande culpado. Ele pode ser uma ferramenta valiosa quando empregado com sabedoria, planejamento e suporte adequado. A questão reside na maneira como a sociedade, o sistema financeiro e o próprio governo abordam essa ferramenta. Programas como o Desenrola Brasil, que visam renegociar dívidas e proporcionar chances de recomeço, são relevantes, mas ainda insuficientes diante da magnitude do problema. O que urge é uma política consistente de educação financeira, desde a infância, aliada a abordagens direcionadas para atender às necessidades de cada grupo etário. Apenas assim será possível quebrar esse padrão de fragilidade que se perpetua através das gerações.

Em um país caracterizado por desigualdades gritantes, assegurar que tanto jovens quanto idosos possuam o conhecimento e o amparo necessários para gerenciar suas finanças é mais do que um tema econômico: é uma questão de honra, cidadania e qualidade de vida para todos.

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