Da Redação
Série de sanções a líderes põe em xeque a democracia
Sucessivos processos contra presidentes geram insegurança política e arranham a imagem internacional do Brasil.
Desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, o Brasil tem enfrentado uma sucessão de eventos que colocam em xeque a solidez de sua democracia. Um dado curioso, mas também alarmante, revela que, dos sete presidentes eleitos após a redemocratização, apenas um — Fernando Henrique Cardoso — concluiu seus mandatos sem enfrentar impeachment, prisão, ou processos criminais.
A sequência é simbólica e, ao mesmo tempo, preocupante. Fernando Collor de Mello foi destituído do cargo em 1992, após um processo de impeachment motivado por denúncias de corrupção. Luiz Inácio Lula da Silva, após dois mandatos e um retorno à vida civil, foi condenado judicialmente em processos relacionados à Operação Lava Jato, ainda que posteriormente as sentenças tenham sido anuladas pelo Supremo Tribunal Federal — seja por vício processual ou mudança de competência.
Dilma Rousseff, sua sucessora, foi impedida em 2016 por manobras fiscais classificadas como crime de responsabilidade. Michel Temer, que assumiu após Dilma, chegou a ser preso preventivamente após deixar o cargo. Jair Bolsonaro, por sua vez, enfrenta hoje uma série de investigações e ações judiciais relacionadas a suposta tentativa de golpe e ataques ao processo eleitoral. E, ironicamente, o atual presidente Lula, mesmo tendo reassumido o Planalto em 2023, volta a ser alvo de discursos que cogitam um novo processo de impeachment.
Esse ciclo vicioso não é apenas um reflexo da polarização política interna, mas também um alerta que reverbera fora das fronteiras nacionais. Para investidores, diplomatas e líderes internacionais, o Brasil passa a imagem de um país institucionalmente instável, incapaz de assegurar continuidade administrativa ou segurança jurídica — dois pilares fundamentais para o desenvolvimento sustentável e a atração de capital estrangeiro.
A repetição de julgamentos de chefes do Executivo — alguns legítimos, outros questionáveis — levanta dúvidas sobre o real equilíbrio entre os Poderes e o uso das instituições democráticas como instrumentos de disputa político-partidária. Se todos os presidentes, sem exceção, são processados ou condenados, cabe perguntar se o problema está exclusivamente nas pessoas que ocupam o cargo ou, mais amplamente, no próprio sistema.
Essa sucessão de eventos coloca a democracia brasileira em um ponto de inflexão. De um lado, é positivo que existam mecanismos de controle e responsabilização. De outro, a banalização dessas medidas pode indicar não uma justiça atuante, mas um Estado disfuncional.
Além disso, a instabilidade recorrente fragiliza a confiança da população na política e desencoraja a participação cívica, alimentando discursos extremistas e anti-institucionais. Em um cenário global de tensões geopolíticas e disputas comerciais, a previsibilidade política é um ativo estratégico. O Brasil, ao perpetuar a imagem de um país onde nenhum presidente escapa ileso ao poder, corre o risco de se marginalizar no cenário internacional.
É urgente repensar o papel das instituições e seus limites. Não se trata de blindar autoridades ou minimizar crimes de responsabilidade. Mas de garantir que os processos sejam justos, isentos e não motivados por disputas ideológicas. O equilíbrio entre vigilância e estabilidade deve ser a bússola da República.
No momento em que o Brasil volta a ser cogitado como protagonista em fóruns internacionais e liderança regional, a política doméstica não pode continuar sendo o seu calcanhar de Aquiles.